Ian Fleming
Ian Fleming | |
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Nome completo | Ian Lancaster Fleming |
Nascimento | 28 de maio de 1908 Londres, Reino Unido |
Morte | 12 de agosto de 1964 (56 anos) Cantuária, Kent, Reino Unido |
Progenitores | Mãe: Evelyn St. Croix Rose Pai: Valentine Fleming |
Cônjuge | Ann Charteris (1952–1964) |
Filho(a)(s) | Caspar Fleming |
Ocupação | |
Gênero literário | |
Magnum opus | James Bond |
Serviço militar | |
Serviço | Marinha Real Britânica |
Anos de serviço | 1939–1945 |
Patente | Comandante |
Unidades | Divisão de Inteligência Naval |
Conflitos | Segunda Guerra Mundial |
Página oficial | |
ianfleming.com |
Ian Lancaster Fleming (Londres, 28 de maio de 1908 – Cantuária, 12 de agosto de 1964) foi um militar, escritor e jornalista britânico mais conhecido por escrever vários romances de espionagem protagonizados por sua criação, o agente secreto James Bond. Ele nasceu em uma família rica de ascendência escocesa, com seu pai tendo sido membro do Parlamento do Reino Unido por Henley de 1910 até sua morte na Frente Ocidental na Primeira Guerra Mundial em 1917. Fleming estudou em Eton, Sandhurst e, brevemente, nas universidades de Munique e Genebra, realizando diversos trabalhos até estabelecer-se como jornalista.
Fleming foi recrutado pelo almirante John Henry Godfrey para trabalhar na Divisão de Inteligência Naval durante a Segunda Guerra Mundial, envolvendo-se no planejamento da não-realizada Operação Goldeneye e no planejamento e supervisão de duas unidades de inteligência, a 30 Assault Unit e a T-Force. Seu serviço em tempos de guerra e sua posterior carreira como jornalista proporcionaram grande parte do pano de fundo, detalhes, inspiração e profundidade para seus romances de James Bond.
Ele escreveu Casino Royale, seu primeiro romance de Bond, em 1952. Foi um grande sucesso que levou à criação de mais onze romances e duas coleções de contos publicados entre 1953 e 1966, os dois últimos postumamente. Seus livros centravam-se em James Bond, um agente do Serviço Secreto Britânico conhecido por seu codinome 007. Seus livros estão entre os mais vendidos de ficção de todos os tempos, com mais cem milhões de cópias vendidas mundialmente, colocando-o como um dos autores mais renomados de seu tempo. Fleming também escreveu o infantojuvenil Chitty-Chitty-Bang-Bang e dois livros de não-ficção.
Fleming casou-se em 1952 com Ann Charteris, que divorciou-se de Esmond Harmsworth, 2º Visconde Rothermere, por conta de um caso com o autor. Fleming e Charteris tiveram um filho, Caspar. Fleming fumou e bebeu bastante durante a maior parte da sua vida adulta e morreu de um enfarte agudo do miocárdio em 1964 aos 56 anos. Outros autores produziram histórias de Bond depois da sua morte. Sua criação também já apareceu na televisão e em 26 filmes, interpretado por oito atores diferentes.
Biografia
[editar | editar código-fonte]Nascimento e família
[editar | editar código-fonte]Ian Lancaster Fleming nasceu no dia 28 de maio de 1908 no número 27 da Rua Green, no rico distrito de Mayfair em Londres.[1][2] Era filho de Evelyn St. Croix Rose e Valentine Fleming, um membro do Parlamento do Reino Unido por Henley de 1910 a 1917.[3] Quando criança ele brevemente viveu em Braziers Park em Oxfordshire junto com sua família.[4] Fleming era neto do financista escocês Robert Fleming, que fundou o Truste de Investimento Escocês-Americano e o banco mercante Robert Fleming & Co..[1][nota 1] Valentine Fleming juntou-se ao Esquadrão "C" dos Hussardos de Oxfordshire da Rainha em 1914 após o início da Primeira Guerra Mundial, ascendendo até a patente de major.[3] Ele morreu na Frente Ocidental em 20 de maio de 1917; Winston Churchill escreveu seu obituário para o The Times.[6] A morte de Valentine foi marcada em um memorial de guerra em Glenelg na Escócia pois a família era dona de uma propriedade em Arnisdale.[7]
Peter Fleming, seu irmão mais velho, tornou-se um escritor de viagens e casou-se com a atriz Celia Johnson. Peter serviu junto aos Guardas Granadeiros durante a Segunda Guerra Mundial, posteriormente sendo comissionado pelo coronel Colin Gubbins para ajudar no estabelecimento das Unidades Auxiliares, uma força militar ultrassecreta e especializada, também envolvendo-se em operações atrás das linhas inimigas na Noruega e na Grécia.[8] Fleming também tinha dois irmãos mais novos, Michael e Richard, e uma meia-irmã materna nascida fora do casamento, a violoncelista Amaryllis Fleming, cujo pai era o pintor Augustus John.[9] Amaryllis foi concebida durante um duradouro caso entre John e Evelyn que começou em 1923, seis anos após a morte de Valentine.[10]
Educação e primeiros anos
[editar | editar código-fonte]Fleming foi estudar aos seis anos de idade em 1914 na Escola Dunford, uma escola preparatória na Ilha de Purbeck em Dorset.[nota 2] Ele não gostou de sua época passada em Dunford, sofrendo de uma comida intragável, dificuldades físicas e intimidação por parte de colegas.[12]
Fleming foi matriculado em 1921 no Colégio Eton. Apesar de não ter excedido academicamente, destacou-se em atletismo e manteve o título de Victor Ludorum ("Vencedor dos Jogos") por dois anos.[13] Também foi o editor do The Wyvern, uma revista escolar.[1] Seu estilo de vida em Eton o colocou em conflito com E. V. Slater, seu senhorio, que desaprovava sua atitude, seu óleo capilar, o fato de ser dono de um carro e suas relações com mulheres. Slater conseguiu persuadir Evelyn a tirar Fleming de Eton um semestre antes do esperado para colocá-lo em um curso especializado a fim de conseguir entrar no Real Colégio Militar de Sandhurst.[12] Ele passou menos de um ano lá, saindo em 1927 sem conseguir uma comissão depois de pegar gonorreia.[13]
Evelyn, com o objetivo de preparar o filho para possivelmente entrar no Escritório Estrangeiro,[14] o enviou em 1927 para o Tennerhof em Kitzbühel, Áustria, uma pequena escola particular administrada por Ernan Forbes Dennis, um discípulo de Alfred Adler e ex-espião britânico, e sua esposa a escritora Phyllis Bottome.[15] Ele aprimorou suas habilidades linguísticas foi estudar brevemente nas universidades de Munique e Genebra.[1] Fleming começou em Genebra um romance com Monique Panchaud de Bottens,[nota 3] com o casal brevemente ficando noivos em 1931.[17] Sua mãe desaprovou e fez com que o filho terminasse o relacionamento.[18] Fleming candidatou-se para entrar no Escritório Estrangeiro, porém falhou nas provas. Evelyn novamente interferiu e foi falar com sir Roderick Jones, chefe da agência de notícias Reuters, conseguindo em outubro de 1931 que o filho recebesse uma posição de subeditor e jornalista na agência.[1] Fleming passou algum tempo em Moscou em 1933, onde cobriu a farsa judicial do julgamento de seis engenheiros da companhia britânica Metropolitan-Vickers.[19] Enquanto estava na cidade ele procurou conseguir uma entrevista com o líder soviético Josef Stalin, ficando extremamente surpreso ao receber uma resposta assinada pelo próprio Stalin se desculpando por não poder aceitar o convite.[20]
Fleming cedeu às pressões familiares em outubro de 1933 e foi trabalhar na área financeira do banco Cull & Co..[19] Dois anos depois foi para a Rowe and Pitman em Bishopsgate como corretor.[20] Ele foi mal sucedido em ambos os cargos.[19][21] Fleming começou um caso no início de 1939 com Ann Charteris, que então era casada com Shane O'Neill, 3º Barão O'Neill;[22] ela ao mesmo tempo também estava tendo um caso com Esmond Harmsworth, herdeiro do Viscondado Rothermere e dono do Daily Mail.[23]
Segunda Guerra Mundial
[editar | editar código-fonte]Fleming foi recrutado em maio de 1939 pelo contra-almirante John Henry Godfrey, diretor da Divisão de Inteligência Naval da Marinha Real Britânica, para que se tornasse seu assistente pessoal. Juntou-se à organização em tempo integral em agosto com o codinome "17F",[24][25] trabalhando na Sala 39 do prédio do Almirantado Britânico.[26] Andrew Lycett, o biógrafo de Fleming, comentou que ele "não [tinha] qualificações óbvias" para o papel.[1] Fleming foi comissionado em julho na Real Reserva Voluntária Naval,[24] inicialmente como tenente,[26] porém foi promovido a comandante alguns meses depois.[27]
Fleming provou-se muito valioso na posição de assistente pessoal de Godfrey e se sobressaiu especialmente em administração.[1] Godfrey era bem conhecido como uma pessoa abrasiva que fez muitos inimigos dentro dos círculos de inteligência. Ele frequentemente usava Fleming como seu oficial de contato com outras seções da administração governamental de guerra, como o Serviço Secreto de Inteligência, o Executivo Político de Guerra, o Executivo de Operações Especiais, o Comitê de Inteligência Conjunta e o estado-maior do primeiro-ministro.[28]
Godfrey circulou um memorando em 29 de setembro de 1939 que, segundo o historiador Ben Macintyre, "possuía todas as marcas registradas do... tenente-comandante Ian Fleming". Foi chamado de o "Memorando da Truta" e comparava a enganação de um inimigo em tempos de guerra com pesca com mosca.[29] O memorando continha vários esquemas que poderiam usados contra o Eixo a fim de atrair u-boots e navios alemães em direção a campos minados.[30] O número 28 da lista foi a ideia de implantar documentos falsos em um corpo que seria encontrado pelo inimigo, sugestão bem similar ao que foi feito na Operação Mincemeat, um plano de 1943 desenvolvido por Charles Cholmondoley em outubro de 1942 e que tinha o objetivo de ocultar a invasão da Sicília a partir do Norte da África. A recomendação foi intitulada "Um Sugestão (uma não muito boa)", também dizendo que "A sugestão a seguir é usada em um livro de Basil Thomson: um corpo vestido como aviador, com despachos nos bolsos, pode ser jogado na costa, supostamente de um paraquedas que não funcionou. Compreendo que não há dificuldades em conseguir corpos no Hospital Naval, porém, claro, teria de ser um fresco".[31]
Fleming e Godfrey entraram em contato em 1940 com Kenneth Mason, professor de geografia da Universidade de Oxford, sobre a preparação de relatórios a cerca das geografias dos países envolvidos em operações militares. Estes foram os precursores da série Naval Intelligence Division Geographical Handbook produzida entre 1941 e 1946.[32]
A Operação Ruthless foi um plano instigado por um memorando escritor por Fleming a Godfrey em 12 de setembro de 1940 e que tinha como objetivo conseguir detalhes dos os códigos da máquina Enigma usada pela Kriegsmarine. A ideia era "obter" um avião bombardeiro alemão, tripula-lo com uma equipe vestida com uniformes da Luftwaffe e que falasse alemão e a joga-lo no meio do Canal da Mancha. A tripulação então atacaria seus socorristas alemães e levaria seu barco com uma Enigma a bordo de volta para a Inglaterra.[33] A missão nunca foi realizada, muito aborrecendo Alan Turing e Peter Twinn em Bletchley Park. Segundo Lucy Fleming, a sobrinha de Ian, um oficial da Real Força Aérea salientou que, caso jogassem um bombardeiro Heinkel no Canal da Mancha, o avião provavelmente afundaria rápido de mais.[34]
Fleming também trabalhou junto com o coronel William J. Donovan, representante especial do presidente norte-americano Franklin D. Roosevelt sobre cooperação de inteligência entre Londres e Washington.[35] Fleming acompanhou Godfrey até os Estados Unidos em maio de 1941, onde o ajudou a escrever a planta geral para o Escritório de Coordenação de Informação, o departamento que depois se transformaria no Escritório de Serviços Estratégicos e por fim na Agência Central de Inteligência (CIA).[36]
Godfrey deixou Fleming encarregado da Operação Goldeneye entre 1941 e 1942; Goldeneye era um plano para manter uma rede de inteligência na Espanha caso a Alemanha conseguisse conquistar o território.[37] O plano de Fleming envolvia manter comunicações com Gibraltar e lançar operações de sabotagem contra os alemães.[38] Ele entrou em contato com Donovan em 1941 sobre o envolvimento norte-americano de tal modo a garantir que a Alemanha não teria domínio dos mares.[39]
30 Assault Unit
[editar | editar código-fonte]Fleming formou em 1942 uma unidade de comandos conhecida como No. 30 Commando, ou 30 Assault Unit (30AU), composta por tropas especialistas em inteligência.[40] O trabalho da 30AU era ficar próxima de linha de frente de um avanço, algumas vezes até mesmo à frente, com o objetivo de tomar documentos do inimigo de quartéis-generais previamente selecionados.[41] A unidade foi baseada em um grupo alemão chefiado por Otto Skorzeny, que havia realizado atividades similares anteriormente em maio de 1941 na Batalha de Creta.[42] Fleming achou que a unidade alemã era "uma das inovações mais espetaculares na inteligência alemã".[43]
Ele não lutou no campo de batalha junto com a unidade, porém selecionou seus alvos e dirigiu as operações a partir de um centro de comando atrás das linhas de frente.[42] A unidade tinha trinta homens quando foi formada, porém esse número cresceu em cinco vezes.[43] A 30AU estava cheia de homens vindos de outras unidades de comandos, tendo sido treinados nas instalações do Executivo de Operações Especiais em combate corpo a corpo, quebra de cofres e uso de gazuas.[42] O capitão Edmund Rushbrooke substituiu Godfrey como chefe da Divisão de Inteligência Naval em 1942, com a influência de Fleming na organização diminuindo gradativamente, porém mesmo assim manteve controle sobre a 30AU.[1] Ele não era popular com os soldados membros da unidade,[43] que não gostavam do fato dele os chamar de "Índios Vermelhos".[44]
A maior parte das operações da 30AU foram no Mediterrâneo antes dos Desembarques da Normandia em 1944, porém também participaram em 1942 do Ataque a Dieppe em uma tentativa fracassada de adquirir uma Enigma e seus materiais. Fleming observou a operação a bordo do contratorpedeiro HMS Fernie, que ficou a 640 metros da costa.[45] A 30AU tornou-se muito confiada pela inteligência naval devido a suas operações de sucesso na Sicília e na Itália.[46][47]
Fleming supervisionou em março de 1944 a distribuição de inteligência para as unidades da Marinha Real Britânica em preparação para a Operação Overlord.[48] Ele foi substituído como chefe da 30AU em 6 de junho de 1944,[42] porém manteve certo envolvimento.[49] Fleming visitou a 30AU no campo durante e após a Operação Overlord, especialmente depois de um ataque contra Cherbourg-Octeville pelo qual ficou preocupado que a unidade tinha sido incorretamente usada como comandos regulares em vez de uma força de coleta de informações. Isto desperdiçou as habilidades especializadas da equipe, arriscou sua segurança em operações que não justificavam o uso de agentes tão especializados e ameaçava a coleta de informações. O uso dessas unidades foi revisto depois disso.[46] Ele também acompanhou a 30AU até a Alemanha depois deles terem descoberto no Castelo de Tambach arquivos alemães de 1870.[50] Fleming também foi enviado em dezembro para uma viagem até o Extremo Oriente em nome de Rushbrooke.[51] Boa parte do tempo foi gasto identificando oportunidades para a 30AU no Pacífico,[52] porém a unidade pouco fez graças à Rendição do Japão.[53]
T-Force
[editar | editar código-fonte]O sucesso da 30AU em operações de inteligência levou à decisão em agosto de 1944 de se estabelecer uma outra unidade chamada Target Force, que acabou ficando conhecida como a T-Force. Um memorando oficial guardado nos Arquivos Nacionais em Londres descreve a função principal da unidade como: "proteger e assegurar documentos, pessoas, equipamentos, com pessoal de combate e inteligência, depois da captura de grandes cidades, portos etc. em território liberado ou inimigo".[54]
Fleming participou do comitê que selecionava os alvos da T-Force e os listava em "Livros Negros" que eram emitidos para os oficiais da unidade.[55] O componente de infantaria da T-Force era em parte composto pelo 5º Batalhão do Regimento do Rei, que tinha apoio do Segundo Exército britânico.[56] A unidade era responsável por assegurar alvos de interesse para o Exército Britânico, incluindo laboratórios nucleares, centros de pesquisa de gás e cientistas de foguete individuais. Suas descobertas mais notáveis ocorreram durante o avanço até o porto alemão de Kiel, no centro de pesquisa usado por engenheiros alemães no desenvolvimento do foguete V-2, nos caças Messerschmitt Me 163 Komet e em u-boots de alta velocidade.[57] Fleming posteriormente usaria elementos das atividades da T-Force em suas obras, principalmente no romance Moonraker de 1955.[58]
Ele compareceu em 1942 a uma conferência de inteligência anglo-americana sediada na Jamaica e, apesar da forte chuva constante durante toda sua estadia, decidiu viver na ilha assim que a guerra acabasse.[59] Seu amigo Ivar Bryce o ajudou a encontrar um pedaço de terra na paróquia de Saint Mary, onde Fleming construiu uma casa em 1945 que chamou de Goldeneye.[60] O nome da casa e da propriedade onde ele viria escrever seus livros possuem muitas possíveis origens. O próprio Fleming mencionou tanto a Operação Goldeneye da guerra quando Reflections in a Golden Eye, um romance de 1941 por Carson McCullers, que descrevia o uso de bases navais no Caribe pela Marinha dos Estados Unidos.[60][61]
Pós-guerra
[editar | editar código-fonte]Fleming foi dispensado em maio de 1945 e tornou-se o gerente estrangeiro do grupo jornalístico Kemsley, que na época era dono do The Sunday Times. Neste papel ele supervisionava a rede de correspondentes estrangeiros do jornal. Seu contrato lhe permitia três meses de férias todo inverno, que passava na Jamaica.[1] Fleming trabalhou em tempo integral no até dezembro de 1959,[62] porém continuou a escrever artigos e comparecer às reuniões semanais de terça-feira até pelo menos 1961.[63][64]
O primeiro marido de Charteris morreu na guerra e esperava-se que ela se casasse com Fleming, porém ele decidiu permanecer solteiro.[1] Ela casou-se então com Harmsworth, agora já o 2º Visconde Rothermere. Charteris mesmo assim continuou seu caso com Fleming, viajando para a Jamaica a fim de vê-lo sob o pretexto de estar visitando seu amigo Noël Coward. Ela deu à luz uma filha de Fleming em 1948, Mary, porém nasceu natimorta. Rothermere divorciou-se de Charteris em 1951 devido ao caso dela,[23] com o casal finalmente se casando em 24 de março de 1952 na Jamaica,[65] alguns meses depois do nascimento de seu filho Caspar em agosto. Tanto Fleming quanto Charteris tiveram casos durante o casamento, ela com Hugh Gaitskell, líder do Partido Trabalhista e da Oposição.[66] Ele teve um duradouro caso na Jamaica com sua vizinha Blanche Blackwell.[67]
Década de 1950
[editar | editar código-fonte]Fleming mencionou seu desejo de escrever um romance de espionagem para amigos durante a guerra,[1] uma ambição que realizou em apenas dois meses com Casino Royale.[68] Ele começou a trabalhar no livro em Goldeneye no dia 17 de fevereiro de 1952, inspirando-se em suas próprias experiências e imaginação. Fleming depois afirmou que escreveu o romance com o objetivo de se distrair de seu iminente casamento com Charteris, que já estava grávida na época,[69] chamando seu trabalho de sua "obra terrível e estúpida".[70] O manuscrito foi digitado em Londres por Joan Howe, a secretária ruiva de Fleming no The Sunday Times em quem a personagem Srta. Moneypenny era parcialmente inspirada.[71] Clare Blanchard, um ex-namorada, o aconselhou a não publicar o livro, ou pelo menos o fazê-lo sob um pseudônimo.[72]
Ele permitiu que seu amigo William Plomer lesse uma cópia de Casino Royale durante os estágios finais de desenvolvimento, com este comentando que "até onde posso ver o elemento de suspense está completamente ausente". Plomer mesmo assim achou que o livro era suficientemente promissor, enviando uma cópia para a editora Jonathan Cape. Ela inicialmente não ficou muito animada com o romance, porém Peter, irmão de Fleming, cujos livros eles também publicavam, conseguiu persuadir a empresa e aceitar a obra.[73] Casino Royale foi publicado no Reino Unido em 13 de abril de 1953 em uma edição de capa dura ao custo de dez xelins e seis pence,[74] com a capa tendo sido desenhada pelo próprio Fleming.[75] Ele foi um sucesso comercial e três tiragens foram necessárias para atender a grande demanda.[74][75][76]
O romance centra-se em James Bond, um oficial do Serviço Secreto de Inteligência. Bond também é conhecido por seu codinome, 007, e é um comandante da Real Reserva Naval. Fleming pegou o nome para o personagem de James Bond, um ornitólogo norte-americano especialista em pássaros do Caribe e autor do guia de campo Birds of the West Indies. O próprio Fleming gostava de observar aves[77] e tinha uma cópia do livro de Bond, posteriormente escrevendo para a esposa deste que "este nome breve, pouco romântico, anglo-saxão e mesmo assim bem masculino era exatamente o que eu precisava, e assim um segundo James Bond nasceu".[78] Ele elaborou mais ainda em 1962: "Quando escrevi o primeiro em 1953, eu queria que Bond fosse um homem extremamente maçante e desinteressante com quem coisas acontecem; eu queria que ele fosse um instrumento cego... quando eu estava caçando por ai por um nome para meu protagonista eu pensei, 'Por Deus, [James Bond] é o nome mais maçante que eu já ouvi'".[79]
Fleming baseou sua criação em diversas pessoas que conheceu no decorrer sua época trabalhando na Divisão de Inteligência Naval, admitindo que Bond "era um composto de todos os agentes secretos e tipos comando que eu conheci durante a guerra". Dentre esses outros tipos estava seu irmão Peter, quem ele idolatrava,[80] e que se envolveu em operações atrás das linhas inimigas na Noruega e Grécia na guerra.[8] Bond, na concepção de Fleming, seria parecido com o compositor, cantor e ator Hoagy Carmichael. Outros, como historiador Ben Macintyre e o autor Kingsley Amis, identificaram aspectos da aparência do próprio Fleming em sua descrição do personagem.[81][82] Referências gerais mencionadas nos romances descrevem Bond como possuindo uma "boa aparência sombria, um pouco cruel".[83]
Aspectos de Bond também foram modelados a partir de Conrad O'Brien-ffrench, um espião quem Fleming conheceu enquanto esquiava em Kitzbühel na década de 1930; Patrick Dalzel-Job, um comando que serviu na 30AU com distinção durante a guerra; e Wilfred Dunderdale, chefe da estação do Serviço Secreto de Inteligência em Paris, que usava abotoaduras e ternos feitos sob medida e era dirigido pela cidade dentro de um Rolls-Royce.[80][84] Sir Fitzroy Maclean, 1º Baronete, foi possivelmente outra inspiração, baseado em seu serviço na guerra atrás das linhas inimigas nos Bálcãs, além do agente duplo Duško Popov.[85] Fleming também colocou muitas de suas próprias características em Bond, incluindo o mesmo handicap em golfe, gosto por ovos mexidos, gosto pro jogos de azar e uso da mesma marca de produtos de higiene pessoal.[43][86]
Fleming, após a publicação de Casino Royale, usou suas férias anuais na Jamaica para escrever mais histórias de Bond.[1] Doze romances e duas coleções de contos foram publicadas entre 1953 e 1966, os dois últimos tendo sido postumamente.[87] Boa parte do pano de fundo veio da época de Fleming na Divisão de Inteligência Naval ou de eventos que tinha ouvido falar na Guerra Fria.[88] O enredo de From Russia, with Love usa uma fictícia máquina de decodificação soviética chamada Spektor a fim de atrair Bond para uma emboscada; o Spektor é baseado na alemã Enigma que Fleming tentou obter durante a guerra.[89] A ideia usada no romance de espiões a bordo do Expresso do Oriente foi baseada na história real de Eugene Karp, um adido naval e de inteligência norte-americano em Budapeste que embarcou no Expresso do Oriente em fevereiro de 1950 para Paris, carregando consigo documentos sobre a rede de espiões dos Estados Unidos no Bloco do Leste. Entretanto, assassinos soviéticos estavam esperando no trem, com o corpo de Karp tendo sido encontrado pouco depois em um túnel ao sul de Salzburgo.[90]
Muitos dos nomes usados nas obras de Bond vinham de pessoas quem Fleming conhecia ou tinha ouvido falar: Francisco Scaramanga, o vilão principal de The Man with the Golden Gun, foi nomeado em homenagem a um antigo colega de Eton com quem Fleming brigou; Auric Goldfinger, vilão de Goldfinger, recebeu seu nome a partir do arquiteto Ernő Goldfinger, quem Fleming detestava;[88] sir Hugo Drax, antagonista de Moonraker, teve o nome tirado do almirante sir Reginald Drax, quem Fleming conhecia;[91] Krebs, assistente de Drax, tem o mesmo nome que Hans Krebs, o último chefe do Estado-maior de Adolf Hitler;[92] "Boofy" Kidd, um dos vilões homossexuais de Diamonds Are Forever, foi nomeado em homenagem a Arthur Gore, 8º Conde de Arran, um dos amigos mais próximos de Fleming e parente de sua esposa, também chamado de Boofy por seus amigos.[88]
The Diamond Smugglers, publicado em 1957, foi o primeiro livro de não-ficção escrito por Fleming e foi parcialmente inspirado por sua pesquisa para Diamonds Are Forever.[93] Boa parte do material tinha aparecido no The Sunday Times e foi baseada em entrevistas que Fleming fez com John Collard, um membro da Organização Internacional para Segurança de Diamantes e que anteriormente tinha trabalhado no Serviço de Segurança.[94] O livro teve uma recepção mista no Reino Unido e nos Estados Unidos.[95]
Fleming foi muito elogiado por seus cinco primeiros livros.[96] Isto começou a mudar em março de 1958 quando Bernard Bergonzi no jornal Twentieth Century atacou suas obras como contendo "uma linha constante e marcada de voyeurismo e sadomasoquismo", também afirmando que os romances demonstravam "uma total falta de qualquer parâmetro ético de referência".[97] Dr. No foi publicado um mês depois e o autor recebeu críticas pesadas de críticos que, segundo Macintyre, "cercaram Fleming, quase como uma alcateia".[98] A opinião mais forte veio de Paul Johnson do New Statesman, que escreveu que o romance era "sem dúvida, o livro mais desagradável que já li". Johnson comentou que "tive que suprimir uma forte vontade de jogar o negócio fora". Ele reconheceu que em Bond existia "um fenômeno social de alguma importância", porém achou que era um elemento negativo, já que envolvia "três ingredientes básicos de Dr. No, todos doentios e completamente ingleses: o sadismo de um intimidador escolar, os anseios sexuais mecânicos e bidimensionais de um adolescente frustrado, e os desejos esnobes de um adulto suburbano. Johnson não enxergou nada de positivo no romance, afirmando que o "Sr. Fleming não possui habilidade literária alguma, a construção do livro é caótica e incidentes e situações inteiras são inseridas e então esquecidas ao acaso".[99]
Lycett afirmou que Fleming "entrou em um declínio pessoal e criativo" depois de problemas conjugais e ataques pesados contra seu trabalho.[1] Goldfinger tinha sido escrito antes da publicação de Dr. No, assim seu livro seguinte produzido após a onde de críticas foi For Your Eyes Only, uma coleção de contos derivados de ideias originalmente formuladas para uma série de televisão que nunca foi produzida.[100] Lycett também comentou que, enquanto Fleming escrevia os roteiros de televisão e os contos, oseu "humor fatigado e insegurança de Ian começaram a afetar sua escrita", algo que pode ser visto nos pensamentos de Bond.[101]
Década de 1960
[editar | editar código-fonte]A Kuwait Oil Company encomendou a Fleming em 1960 que ele escrevesse um livro sobre o país e sua indústria petrolífera. Entretanto, o governo não aprovou o manuscrito, State of Excitement: Impressions of Kuwait, e ele nunca foi publicado. Segundo Fleming, "A Oil Company expressou sua aprovação do livro, porém sentiu que era seu dever submeter o manuscrito aos membros do Governo do Kuwait para sua aprovação. Os Xeques consideraram alguns leves comentários e críticas, e particularmente passagens falando sobre o passado aventureiro do país que agora quer ser 'civilizado' em todos os aspectos e esquecer suas origens românticas, como sendo de gosto desagradável".[102]
O trabalho seguinte de Fleming após a decepção de For Your Eyes Only foi Thunderball, uma romantização de um roteiro para cinema que ele havia trabalhado em parceria com outras pessoas. O trabalho tinha começado em 1958 quando Ivar Bryce, seu amigo, lhe apresentou ao jovem diretor e roteirista irlandês Kevin McClory, com os três mais Ernest Cuneo, amigo de Bryce, trabalhando em um roteiro original.[95] McClory trouxe o experiente roteirista Jack Whittingham para a equipe em outubro,[103] com os dois enviando a Fleming em dezembro de 1959 um roteiro finalizado.[104] O autor estava começando a reconsiderar o envolvimento de McClory, explicando em janeiro de 1960 que tinha a intenção de levar o roteiro para a MCA junto com uma recomendação de que Whittingham e McClory fossem os produtores. Ele também disse que caso a MCA rejeitasse o filme por causa do envolvimento de McClory, então este deveria vender sua parte para o estúdio, sair do acordo ou processar.[105]
Fleming trabalhou entre janeiro e março de 1960 em Goldeneye escrevendo o romance de Thunderball, que era baseado no roteiro desenvolvido por ele mesmo, McClory e Whittingham.[106] McClory conseguiu ler em março de 1961 uma cópia adiantada do livro e ele e Whittingham imediatamente foram até a Alta Corte de Justiça em Londres a fim de conseguirem uma injunção com o objetivo de impedir a publicação da obra.[107] Seguiram-se dois processos legais, o segundo em novembro do mesmo ano.[108] Fleming então ofereceu um acordo a McClory, que foi aceito fora dos tribunais. McClory ficou com os direitos literários e de adaptação do roteiro, enquanto Fleming ficou com os direitos do romance, contato que reconhecesse como "baseado em um tratamento de roteiro por Kevin McClory, Jack Whittingham e o Autor".[109]
Os livros de Fleming sempre venderam bem, porém os números de vendas cresceram dramaticamente em 1961. From Russia, with Love foi listado pela revista Life em 17 de março de 1961, quatro anos após sua publicação e três anos depois das enormes críticas contra Dr. No, como um dos dez livros favoritos do presidente norte-americano John F. Kennedy.[110] Kennedy havia anteriormente conhecido Fleming em Washington, D.C..[79] Este reconhecimento e toda a publicidade consequente acarretou em um salto de vendas que fez de Fleming o autor criminal mais vendido nos Estados Unidos.[111][112] Fleming considerava From Russia, with Love como seu melhor romance, mas mesmo assim afirmou que "a melhor coisa é que cada um dos livros parece ser o favorito com uma ou outra parte do público e nenhum até agora foi completamente repudiado".[89]
Pouco depois do segundo processo sobre Thunderball, em abril de 1961,[1] Fleming sofreu um enfarto durante uma reunião semanal de rotina no The Sunnday Times. Duff Dunbar, um de seus amigos, lhe deu uma cópia de The Tale of Squirrel Nutkin de Beatrix Potter enquanto ele se recuperava, sugerindo que Fleming deveria dedicar parte de seu tempo a escrever a história de ninar que ele costumava contar a Casper todas as noites.[63] Fleming mergulhou no projeto com entusiasmo e escreveu a Michael Howard, seu editor na Jonathan Cape, brincando que "Não há um momento, mesmo à beira do túmulo, quando não estou implorando por você".[113] O resultado foi Chitty-Chitty-Bang-Bang, o único romance infantojuvenil produzido por Fleming, que foi publicado em outubro de 1964, dois meses depois de sua morte.[114]
Fleming vendeu em junho de 1961 os direitos cinematográficos de Bond, com a exceção de Casino Royale, que já havia sido vendido, para o produtor canadense Harry Saltzman.[107] Este formou a companhia Eon Productions junto com o produtor norte-americano Albert R. Broccoli e os dois iniciaram uma procura por um ator para interpretar o personagem, por fim escolhendo o escocês Sean Connery e lançando em 1962 o filme Dr. No.[115][116] A interpretação de Connery afetou sua contraparte literária; em You Only Live Twice, o primeiro romance escrito após a estreia do filme, Fleming deu a Bond antepassados escoceses e um senso de humor ausente nas histórias anteriores.[117]
Seu segundo livro de não-ficção foi lançado em novembro de 1963, chamado de Thrilling Cities,[118] uma republicação de uma série de artigos de viagens que Fleming escreveu para o The Sunday Times sobre suas impressões de cidades que visitou ao redor do mundo entre 1959 e 1960.[119][120] O produtor televisivo norte-americano Norman Felton abordou o autor em 1964 sobre a possibilidade da criação de uma série de espionagem, com Fleming tendo várias ideias, inclusive os nomes dos personagens Napoleon Solo e April Dancer, que fariam parte da série The Man from U.N.C.L.E..[121] Entretanto, ele saiu do projeto depois de um pedido da Eon Productions, que estava querendo evitar quaisquer possíveis problemas legais que poderiam ocorrer caso o projeto se sobreposse aos filmes de Bond.[122]
Fleming foi para Goldeneye em janeiro de 1964 para aquelas que seriam suas últimas férias e escreveu o primeiro rascunho de The Man with the Golden Gun.[123] Ele não ficou satisfeito e escreveu para William Plomer, o editor de texto de seus romances, pedindo permissão para que fosse reescrito.[124] Fleming ficou cada vez mais insatisfeito com o livro e considerou reescreve-lo por completo, porém foi dissuadido por Plomer, que o considerou viável para publicação.[125]
Morte
[editar | editar código-fonte]Fleming bebeu e fumou muito durante toda sua vida adulta, sofrendo consequentemente de doença cardiovascular.[nota 4] Ele sofreu um infarto agudo do miocárdio em 1961 aos 53 anos de idade, tendo dificuldades para se recuperar. Fleming foi almoçar no Royal St George's Golf Club na Cantuária em 11 de agosto de 1964 enquanto estava em um hotel, à noite indo jantar com amigos. O dia foi exaustivo e ele sofreu outro infarto logo depois da refeição.[128] Ian Fleming morreu aos 56 anos de idade nas primeiras horas de 12 de agosto de 1964, o aniversário de doze anos de seu filho Caspar.[129][130] Suas últimas palavras registradas foram um pedido de desculpas aos motoristas da ambulância pela inconveniência que ele estava lhes causando:[131] "Lamento pelo incômodo, rapazes. Eu não sei como vocês andam tão rápido com o trânsito dessas estradas hoje em dia".[132] Ele foi enterrado no adro da igreja do vilarejo de Sevenhampton, perto de Swindon no condado de Wiltshire.[133]
The Man with the Golden Gun e Octopussy and The Living Daylights, os dois últimos livros de Fleming, foram publicados postumamente.[87] The Man with the Golden Gun foi publicado oito meses depois da sua morte e não tinha passado pelo processo de revisão total de Fleming.[134] Consequentemente, a editora Jonathan Cape achou que o romance era fino e "fraco". A editora entregou o manuscrito a Kingsley Amis para que ele o lesse durante as férias, porém não usaram suas sugestões.[135] O biógrafo Henry Chandler comentou que a obra "recebeu críticas educadas e um pouco tristes, reconhecendo que o livro tinha sido efetivamente deixado meio-acabado, assim sendo não representava Fleming no seu melhor".[136] Octopussy and The Living Daylights, o último livro de Bond contendo dois contos, foi publicado em junho de 1966.[137]
Seu filho Caspar Fleming cometeu suicídio em outubro de 1975 aos 23 anos de idade por meio de uma overdose,[138] sendo enterrado ao lado do pai.[133] Sua viúva Ann Charteris morreu em 1981 e foi enterrada junto com o marido e filho em Sevenhampton.[1]
Escrita
[editar | editar código-fonte]O autor Raymond Benson, que depois viria a escrever vários romances de Bond, comentou que os livros de Fleming podem ser divididos em dois períodos distintos com base em linhas estilísticas. Os livros escritos entre 1953 e 1960 tendem a se concentrar em "clima, desenvolvimento de personagem e avanço do enredo",[139] enquanto aqueles publicados entre 1961 e 1966 incorporavam mais detalhes e imagens. Benson argumentou que Fleming tinha se tornado "um mestre contador de histórias" pela época que escreveu Thunderball em 1961.[137]
O historiador Jeremy Black dividiu a série baseado nos vilões criados por Fleming, uma divisão apoiada pelo também acadêmico Christoph Lindner.[140] Assim, os primeiros livros, de Casino Royale a For Your Eyes Only, são considerados "histórias da Guerra Fria", com a SMERSH como antagonista;[141] estes são seguidos por Blofeld e a SPECTRE em três romances, Thunderball, On Her Majesty's Secret Service e You Only Live Twice, depois da melhora nas relações entre ocidente e oriente.[142][nota 5] Black e Lindner classificam os três livros restantes, The Spy Who Loved Me, The Man with the Golden Gun e Octopussy and The Living Daylights, como "histórias posteriores de Fleming".[144]
Estilo e técnica
[editar | editar código-fonte]Fleming comentou que "apesar de suspenses talvez não serem Literatura com L maiúsculo, é possível escrever o que melhor posso descrever como 'suspenses projetados para serem lidos como literatura'".[145] Ele nomeou Raymond Chandler, Dashiell Hammett, Eric Ambler e Graham Greene como influências.[146] William Cook considerou que James Bond era "o ápice de uma tradição importante mas muito difamada na literatura inglesa. Fleming, quando menino, devorou os contos de Bulldog Drummond pelo tenente-coronel Herman Cyril McNeile e as histórias de Richard Hannay por John Buchan. Sua genialidade foi reembalar essas aventuras antiguadas para encaixarem-se na moda do Reino Unido pós-guerra... Em Bond, ele criou o Bulldog Drummond da era a jato".[86] Umberto Eco considerou que Mickey Spillane também foi outra influência.[147]
Fleming descreveu em maio de 1963 para a revista Books and Bookmen sua abordagem para escrever seus livros: "Eu escrevo por volta de três horas pela manhã... e faço outra hora de trabalho entre às seis e sete da tarde. Eu nunca corrijo algo ou volto para ver o que escrevi... Você escreve 2 000 palavras por dia seguindo minha fórmula".[145] Benson identificou o que chamou "Varredura Fleming", o uso de "ganchos" ao final de capítulos a fim de aumentar a tensão e levar o leitor ao próximo.[139] Esses ganchos combinam com o que o autor Anthony Burgess chamou de "um estilo jornalístico elevado"[148] para produzir "uma velocidade de narrativa, que leva o leitor a cada ponto de perigo da história".[149]
Eco analisou a obra de Fleming do ponto de vista estruturalista[150] e identificou várias oposições dentro dos enredos que criam estrutura e narrativa, incluindo:[151]
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Eco também percebeu que os vilões de Bond costumam vir da Europa Central ou de países eslavos e mediterrâneos, sendo miscigenados e com "origens complexas e obscuras".[152] Eco descobriu que os vilões são geralmente assexuados ou homossexuais, inventivos, astutos, organizados e ricos.[152] Jeremy Black também percebeu o mesmo aspecto: "Fleming não usou inimigos de classe como seus vilões, ao invés disso apoiou-se em deformações físicas ou identidades étnicas ... Ademais, vilões estrangeiros usam servos e empregados estrangeiros ... Esse racismo reflete não apenas um tema de entre guerras na escrita, como os romances de Buchan, mas também a cultura literária generalizada".[153] A escritora Louise Welsh acha que o romance Live and Let Die "cutuca a paranoia que alguns setores da sociedade branca estavam sentindo" enquanto os movimentos dos direitos civis desafiavam o preconceito e a desigualdade.[154]
Fleming usou marcas famosas e detalhes do dia-a-dia para apoiar seu realismo.[145] Kingsley Amis chama isso de "o efeito Fleming",[155] descrevendo-o como "o uso imaginativo de informação, dessa forma a penetrante natureza fantástica do mundo de Bond ... [é] diminuída até uma realidade, ou pelo menos contra-equilibrada".[156]
Principais temas
[editar | editar código-fonte]Declínio britânico
[editar | editar código-fonte]Os romances de Bond foram escritos após a guerra, quando o país ainda era uma potência imperial.[157] Enquanto a seria progredia, o Império Britânico entrou em declínio; o jornalista William Cook salienta que "Bond bajulava a autoimagem inflada e cada vez mais insegura do Reino Unido, nos lisonjeando com a fantasia de que a Britannia ainda poderia dar um soco forte".[86] A perda de poder do Reino Unido é referenciada em vários romances e, em From Russia, with Love, isso é manisfestado nas conversas entre Bond e Darko Kerim quando o primeiro admite que na Inglaterra "nós não mais mostramos os dentes – apenas gengivas".[158][159] O tema aparece fortemente em You Only Live Twice, de 1964, durante conversas entre Bond e o chefe do serviço secreto de inteligência do Japão, Tiger Tanaka. Fleming estava ciente da perda de prestígio de seu país nas décadas de 1950 e 1960, particularmente após o Confronto Indonésia-Malásia, quando ele fez Tanaka acusar o Reino Unido de jogar fora o império "com as duas mãos".[159][160][161]
Black salienta que as deserções de quatro membros do MI6 para a União Soviética teve um grande impacto na imagem do Reino Unido perante os círculos de inteligência norte-americanos.[162] A última deserção foi a de Kim Philby em janeiro de 1963,[163] enquanto Fleming ainda estava escrevendo o primeiro rascunho de You Only Live Twice.[164] A reunião entre M e Bond é a primeira vez em doze romances que Fleming fala sobre as deserções.[165] Black argumenta que a conversa entre M e Bond permite que Fleming discuta o declínio do país, com as deserções do Caso Profumo em 1963 servindo como pano de fundo.[161] Duas deserções ocorreram pouco antes de Fleming começar a escrever Casino Royale,[166] e o biógrafo do autor, Andrew Lycett, percebe que o livro pode ser visto como a tentativa de Fleming "para refletir a perturbadora ambiguidade moral de um mundo pós-guerra que poderia produzir traidores como Burgess e Maclean".[167]
Pelo final da série, no romance The Man with the Golden Gun de 1965, Black observa que um inquérito independente foi feito pelo judiciário jamaicano, enquanto foi registrado que o MI6 e a CIA estavam agindo "sob a mais próxima ligação e direção do CID jamaicano": esse era o novo mundo da Jamaica independente, salientando ainda mais a queda do Império Britânico.[168] O declínio do país foi refletido no uso de equipamentos e pessoal norte-americanos por parte de Bond.[169] Geopolíticas incertas fizeram Fleming substituir a organização russa SMERSH pelo grupo terrorista internacional SPECTRE em Thunderball, permitindo o "mal sem restrições de ideologia".[170] Black diz que a SPECTRE dá certa continuidade ao restante das histórias da série.[141]
Efeitos da guerra
[editar | editar código-fonte]Um tema recorrente na série são os efeitos da Segunda Guerra Mundial.[171] O jornalista Ben Macintyre considera que Bond era "o antídoto ideal para a austeridade britânica do pós-guerra, raciocinando a iminente premonição da perda de poder",[172] em uma época que carvão e muitos itens como comida ainda estavam sendo racionados.[86] Fleming frequentemente usou a guerra como sinal para estabelecer o "bem" e o "mal" nos personagens:[92][173] em For Your Eyes Only, o vilão, Hammerstein, é um ex-oficial da Gestapo, enquanto que o simpático oficial da Real Polícia Montada do Canadá, Coronel Johns, serviu sob o comando de Bernard Montgomery no 8º Exército Britânico.[174] Similarmente, em Moonraker, Hugo Drax (Graf Hugo von der Drache) é um "nazista megalomâniaco que se disfarça de cavalheiro britânico",[175] e seu assistente, Krebbs, tem o mesmo nome que o último Chefe de Gabinete de Hitler.[92] Dessa forma, Fleming "explora outra antipatia cultural britânica dos anos 1950. Alemães, no rastro da Segunda Guerra Mundial, se tornaram outro alvo fácil e óbvio para má publicidade".[175] Enquanto a série progredia, a ameaça do ressurgimento da Alemanha foi superada pelas preocupações da Guerra Fria, e os romances mudaram seu foco de acordo.[176]
Camaradagem
[editar | editar código-fonte]Periodicamente na série, o tópico de camaradagem ou amizade aparece com o aliado que trabalha junto com Bond na missão.[177] Raymond Benson acredita que as relações que Bond tem com seus aliados "adiciona outra dimensão ao personagem, e, por fim, à continuidade temática dos romances".[178] Em Live and Let Die, a importância de aliados e amigos homens é mostrada com Felix Leiter e Quarrel, com a relação de Leiter e Bond sendo particularmente forte, dando um contra-ponto ao ataque de tubarão que o agente da CIA sofre durante a história e as respostas emocionais que Bond tem: Benson observa que "a lealdade de Bond para com seu amigo é tão forte quanto seu comprometimento com sua missão".[179] Em Dr. No, a relação entre Bond e Quarrel é mutualmente sentida. Quarrel é "um aliado indispensável".[180] Benson não vê nenhuma discriminação na relação entre os dois homens[181] e acha que Bond sente um remorso genuíno e tristeza pela morte de Quarrel.[182]
Estados Unidos
[editar | editar código-fonte]Os romances de Bond também lidam com as relações anglo-americanas, refletindo o papel central dos EUA na defesa do Oeste.[183] Após o final da Segunda Guerra Mundial, tensões apareceram entre o governo britânico, que estava tentando manter seu império, e o desejo norte-americano para uma nova ordem mundial capitalista, porém Fleming não abordou isso diretamente, acabando por criar "uma impressão de normalidade nas ações do Reino Unido".[183] O autor e jornalista Christopher Hitchens salienta que "o paradoxo das histórias clássicas de Bond é que elas estão cheias de desprezo e ressentimento pela América e os americanos, apesar de serem superficialmente dedicadas a guerra anglo-americana contra o comunismo".[184] Apesar de Fleming estar ciente da tensão entre os dois países, ele não se focou muito.[171] Kingsley Amis, em seu livro The James Bond Dossier, aponta que "Leiter, uma nulidade como peça de caracterização ... ele, o americano, recebe ordens de Bond, o britânico, e Bond está constantemente se saindo melhor que ele".[185]
Em três romances, Goldfinger, Live and Let Die e Dr. No, é Bond que tem de resolver aquilo que é um problema norte-americano,[186] e Jeremy Black mostra que apesar de norte-americanos estarem sob ameaça em Dr. No, um agente britânico e um navio britânico, o HMS Narvick, são enviados com soldados britânicos para a ilha para resolver a situação no final do romance.[187] Fleming acabou ficando bem invejoso sobre os EUA, e seus comentários em You Only Live Twice refletem isso;[188] as respostas de Bond para os comentários de Tanaka refletem o declínio das relações entre o Reino Unido e os EUA – em contraste com a relação amigável e cooperativa de Bond e Leiter nos romances anteriores.[161]
Legado
[editar | editar código-fonte]Após a morte de Fleming, seus editores literários periodicamente contrararam outros autores para continuar os romances de James Bond. Durante o período entre 1957 e 1964, Fleming trabalhou intermitentemente com o escritor Geoffrey Jenkins em uma ideia de história para Bond. Depois da morte de Fleming, Jenkins recebeu um pedido da Glidrose Productions para escrever um romance de Bond, Per Fince Ounce, que nunca foi publicado.[189] Começando com Colonel Sun, escrito por Kingsley Amis sob o pseudônimo "Robert Markham", em 1968,[190] vários outros autores escreveram romances com o personagem, incluindo Sebastian Faulks, que recebeu um pedido da Ian Fleming Publications para escrever um novo romance de Bond que seria lançado no centenário de nascimento de Fleming em 2008.[191]
Durante sua vida, Fleming vendeu mais de trinta milhões de livros; o dobro desse número foi vendido apenas nos dois anos seguintes após sua morte.[1] Em 2008, o The Times o colocou na décima-quarta posição em sua lista dos "50 Maiores Escritores Britânicos desde 1945".[192] Em 2002, a Ian Fleming Publications anunciou o lançamento do prêmio CWA Ian Fleming Steel Dagger, entregue pela Crime Writers' Association para o melhor romance de espionagem, aventura ou suspense publicado no Reino Unido.[193]
A série de filmes de Bond produzidos pela EON Productions, que começou em 1962 com Dr. No, continuou após a morte de Fleming. Junto com outros dois filmes independentes, a EON já produziu vinte e três filmes com o personagem, com o último, Skyfall, sendo lançado em novembro de 2012.[194] A série da EON Productions já arrecadou US$ 5.089.726.104 (mais de US$ 12.360.000.000 com a inflação ajustada) mundialmente, sendo a segunda série de maior arrecadação da história, atrás apenas de Harry Potter.[195]
A influência de Bond no cinema e na literatura é evidente em filme e livros diversos como a série Austin Powers,[196] Carry On Spying[197] e o personagem Jason Bourne.[193] Em 2011, Fleming se tornou o primeiro escritor de língua inglesa a ter um aeroporto internacional nomeado em sua homenagem. O Aeroporto Internacional Ian Fleming, em Boscobel, Jamaica, foi oficialmente inaugurado em 12 de janeiro de 2011 pelo Primeiro-Ministro da Jamaica Bruce Golding e pela sobrinha de Fleming, Lucy.[198]
Trabalhos
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Notas
- ↑ O Robert Fleming & Co. foi comprado em 2000 pela JPMorgan Chase.[5]
- ↑ A escola era localizada próxima da propriedade de uma família Bond verdadeira, que pode traçar sua ancestralidade até John Bond, um espião elisabetano, cujo lema era Non Sufficit Orbis ("O Mundo Não é o Bastante").[11]
- ↑ Algumas fontes falam que seu nome era Monique Panchaud de Bottomes.[16]
- ↑ Fleming fumava setenta cigarros por dia quando tinha 38 anos.[126] Ele os encomendava sob medida da mesma tabacaria desde a década de 1930, com três faixas douradas sendo adicionadas no filtro com o objetivo de refletir sua patente de comandante.[127]
- ↑ Apesar da melhora, a Guerra Fria logo voltou a ficar cada vez mais tensa, com a Invasão da Baía dos Porcos, a construção do Muro de Berlim e a Crise dos Mísseis de Cuba todos ocorrendo em um período de dezoito meses de abril de 1961 a novembro de 1962.[143]
- ↑ A primeira edição norte-americana de Casino Royale recebeu o título de You Asked For It,[199] e o nome de Bond foi alterado para "Jimmy Bond".[200]
- ↑ A primeira edição norte-americana de Moonraker recebeu o título de Too Hot to Handle.[201]
- ↑ Consiste nos contos: "From a View to a Kill", "For Your Eyes Only", "Risico", "Quantum of Solace" e "The Hildebrand Rarity".
- ↑ Devido a uma batalha judicial, a história do livro é creditada também a Kevin McClory e Jack Whittingham.[109]
- ↑ Originalmente publicado com os contos "Octopussy" e "The Living Daylights"; edições modernas também contém "The Property of a Lady" e "007 in New York".
Referências
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Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- Página oficial da Ian Fleming Publications (em inglês)
- Ian Fleming. no IMDb.
- Nascidos em 1908
- Mortos em 1964
- Ian Fleming
- Naturais de Londres
- Alunos da Universidade de Munique
- Alunos da Universidade de Genebra
- Oficiais da Marinha Real Britânica
- Pessoas da Segunda Guerra Mundial (Reino Unido)
- Espiões do Reino Unido
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- Escritores da Inglaterra
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